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ARTICULAÇÕES ENTRE CTSA E A CIÊNCIA E TECNOLOGIA EM HERBERT MARCUSE

Articulações entre a Perspectiva CTSA e a Ciência e a Tecnologia em Herbert Marcuse: Contribuições para o Ensino de Ciências

Articulations between the CTSA Perspective and Science and Technology in Herbert Marcuse: Contributions for Science Education

Geilson Rodrigues da Silva[1]

Marcelo Carbone Carneiro[2]

Resumo

Na presente pesquisa tivermos os objetivos de realizar aproximações entre a perspectiva CTSA com as ideias sobre Ciência e Tecnologia e tecer contribuições para o Ensino de Ciências na sociedade unidimensional. Isso permite refletir sobre a participação das pessoas cientes das suas reais necessidades sendo um fator decisivo para a transformação da sociedade unidimensional em uma sociedade mais justa e igualitária no qual as pessoas estarão envolvidas e entenderam como ocorrem os processos de tomadas de decisões de forma a transcender a própria visão de participação das pessoas como preza a perspectiva CTSA para que elas além de participar sejam protagonistas do processo político no sentido de construírem uma nova sociedade em que as lutas de classes não existam mais. Diante disso, apontarmos que a área de Ensino de Ciências avança quando discute questões que problematizam o caráter neutro que as classes dominantes querem que as pessoas tenham em relação a Ciência e a Tecnologia e que refletem nos movimentos de negacionismo científico em uma pandemia que provocou a desinformação sobre a vacinação. Assim, entendermos que a perspectiva CTSA integrado com as ideias de Marcuse permite compreender questões complexas cada vez mais presentes na sociedade unidimensional, bem como, a crise das democracias com a ascensão da desinformação com intuito de controle das pessoas para que elas possam defender o sistema vigente. 

Palavras-chave: sociedade unidimensional, neutralidade, democracia

Abstract

In the present research we had the objectives to make approximations between the CTSA perspective and the ideas about Science and Technology and to make contributions to Science Teaching in the one-dimensional society. This allows us to reflect on the participation of people aware of their real needs as a decisive factor for the transformation of the one-dimensional society into a more just and egalitarian one, in which people will be involved and understand how the processes of decision making occur in order to transcend the very vision of people's participation, as the CTSA perspective preaches, so that, besides participating, they can be protagonists of the political process in order to build a new society in which class struggles no longer exist. Therefore, we point out that the area of Science Teaching advances when it discusses issues that problematize the neutral character that the dominant classes want people to have in relation to Science and Technology and that reflect in the movements of scientific denials in a pandemic that caused disinformation about vaccination. Thus, we understand that the CTSA perspective integrated with Marcuse's ideas allows us to understand complex issues that are increasingly present in a one-dimensional society, as well as the crisis of democracies with the rise of disinformation aiming to control people so that they can defend the current system.

Keywords: one-dimensional society, neutrality, democracy

Introdução

Os estudos envolvendo Ciência, Tecnologia, Sociedade e Meio Ambiente (CTSA), têm crescido de forma relevante no contexto educacional brasileiro em especial no Ensino de Ciências. Dentre os diversos estudos temos aqueles que contemplam o currículo, a formação de professores, revisões da literatura, estudos de caso, articulações com referenciais importantes tais como Paulo Freire e Henry Giroux, reflexões teóricas, discussões com a Didática das Ciências. (Santos e Mortimer, 2000; Strieder, 2012; Lacerda et al., 2016; Rosa, 2019; Cardoso et al., 2020; Fernandes e Gouvea, 2020, Freitas e Queirós, 2020; Gomes et al., 2021; Lara et al., 2021).

Entretanto dos estudos que envolvem o CTSA com reflexões teóricas não identificarmos aproximações com a Filosofia da Tecnologia em especial com os trabalhos do pensador Herbert Marcuse que teceu importantes críticas a Ciência e a Tecnologia (Silva e Carneiro, 2023). A busca pela articulação da perspectiva CTSA com as críticas de Herbert Marcuse sobre Ciência e Tecnologia expressos no seu livro a ideología da Sociedade Industrial (1969), ocorre devido as ideias sobre o CTSA serem importante para problematizar a relevância de formação de cidadãos que sejam críticas e que possam tomar decisões em relação à questões complexas que envolvem a Ciência e a Tecnologia na sociedade unidimensional. Acreditarmos que a perspectiva CTSA pode ser enriquecida e avançar com as ideias de Herbert Marcuse pois para o pensador a Ciência e a Tecnologia não são neutras e na sociedade capitalista avançada ela está a serviço da dominação pelas classes com poder econômico e político sendo utilizadas para criar uma falsa realidade fazendo com que as pessoas sejam ludibriadas com necessidades implantadas no seu subjetido que elas acreditam que sejam verdadeiras. Tal dominação, permite que as pessoas convivam com a miséria, com a pobreza acreditando que são “naturais” e portantas inatas a sociedade. Nesse sentido, tivermos nessa pesquisa os seguintes objetivos: Realizar aproximações entre a perspectiva CTSA com as ideias sobre Ciência e Tecnologia e tecer contribuições para o Ensino de Ciências na sociedade unidimensional.

Desenvolvimento

Aproximações entre a Perspectiva CTSA e as ideias sobre Ciência e Tecnologia em Herbert Marcuse

Não temos como objetivo esgotar toda as possibilidades de discussões da abordagem CTSA; mas sim apresentar as principais ideias dessa abordagem e suas possibilidades de integração com as ideias de Marcuse. Sendo assim, estarmos vivenciando um mundo completamente moldado pelo avanço científico e tecnológico com impactos em praticamente todas as áreas do conhecimento humano apresentando melhorias na expectativa de vida das pessoas e também novas formas de destruição e envenenamento do planeta, assim, seja de forma direta ou indireta somos oriundos de uma sociedade científica e tecnológica (Díaz et al., 2003, Fonseca, 2007, Ricardo, 2020, Rodríguez Del-Pino, 2023).

Desta forma, é pertinente a indagação como é a relação da sociedade com a Ciência e a Tecnologia? A sociedade têm sido uma mera consumidora de Ciência e da Tecnologia em detrimento da compreensão de como ocorre a produção de conhecimentos científicos e tecnológicos propagada pela visão de neutralidade da Ciência e da Tecnologia para edificar as bases de defesa da sociedade unidimensional. Assim, acreditarmos que propor uma aproximação com a Educação CTSA é frutífera para enriquecer as discussões e contribuir para refletirmos a intricada relação da Ciência e da Tecnologia com a sociedade.

A perspectiva CTSA surgiu inicialmente entre as décadas de 1960 e 1970 sendo denominado inicialmente de CTS emergindo como um movimento que irá criticar a maneira pela qual a Ciência e a Tecnologia é vista pela população. Essa perspectiva ganhou força inicialmente nos países da Europa Ocidental nos Estados Unidos e Canadá e que também influenciou a Educação nesses países refletindo o contexto geopolítico de guerra fria e da disputa pela hegemonia de visões de mundo e de disputa ideológica em todas as áreas de conhecimento e de setores da sociedade. Desse modo, no seu cerne Santos (2008), apontou que:

O agravamento dos problemas ambientais e discussões sobre a natureza do conhecimento científico e seu papel na sociedade fizeram com que crescesse no mundo todo um movimento que passou a refletir mais criticamente as relações entre ciência, tecnologia e a sociedade em que esses conhecimentos estão inseridos... (Santos, 2008, p. 111)

Com isso, podermos refletir se a perspectiva CTS inicialmente já vinha sendo discutido a tanto tempo então porque ela não foi utilizada para libertar as pessoas da sociedade unidimensional? Bem, inicialmente temos que ponderar que a Ciência e a Tecnologia mesmo na perspectiva CTSA têm influências da sociedade o qual está inserida. Assim o potencial desvelado da realidade e sua real capacidade de transformação podem ser catalisados com a lente marcuseana de análise da sociedade unidimensional contribuindo com a perspectiva CTSA para transformarem a realidade e uma nova vida seja possível em harmonia com a natureza e com a redução das desigualdades sociais e com o tempo criativo para aliar os seres humanos com uma transcendência para um novo mundo.

 Assim sendo, Santos e Mortimer (2000), apontou que uma das características importantes do CTSA é uma busca pela participação ativa dos diversos setores da sociedade em questões complexas tais como, a elaboração, financiamento e aplicações da ciência e tecnologia. De acordo com, Santos (2011):

O CTSA é um movimento que deve visar, entre outras coisas, a democratização dos processos decisórios de forma que “[...] um dos objetivos centrais desse movimento consistiu em colocar a tomada de decisões em relação à ciência e a tecnologia num outro plano. Reivindicam-se decisões mais democráticas (mais atores sociais participando) e menos tecnocráticas” (Auler, 2003, p. 71). Essa ideia também é reforçada por Santos (2011), para quem, “na educação científica, o movimento CTS assumiu como objetivo o desenvolvimento da capacidade de tomada de decisão na sociedade científica e tecnológica e o desenvolvimento de valores” (Santos, 2011, p. 23).

Percebermos com isso, que a perspectiva CTSA apresenta em seu cerne as preocupações com a democratização, mas voltado a tomada de decisões que seja participativa voltado para os impactos da Ciência e da Tecnologia, enquanto, que Marcuse discutiu a utilização da Ciência e da Tecnologia com instrumento de dominação. Diante disso, propomos nessa articulação a perspectiva CTSA pode ser utilizadas para além de tomadas de decisões, reformulações de currículos e formação de professores também para emancipar os seres humanos da sociedade unidimensional.

Então como podermos utilizar a perspectiva CTSA para emancipar as pessoas na sociedade unidimensional? Podermos tecer que na tomada de decisão democrática demanda entender que as nossas necessidades são impostas pela sociedade unidimensional sem consulta a população não permitindo o diálogo e as necessidades não são de natureza real e sim produto de uma sociedade de exploração marcado pelas desigualdades sociais. Assim, as pessoas devem participar do processo democrático de tomada de decisões e ir além das meras aparências para compreenderem que mesmo suas decisões não são neutras e estão orientadas pelas amarras do sistema capitalista de opressão no qual seu planeja e desenvolver ações já são orientadas para manter a sociedade unidimensional.

Para a tomada de decisões ser realmente livre das amarras sociais do sistema capitalista, pois Marinho (2022)

...imagina uma racionalidade tecnológica desprovida de suas características espoliativas com o objetivo de “planejar e desenvolver, para todos, os recursos disponíveis”, e considera que este é o trabalho a ser realizado por esse tipo de razão adequacional, um trabalho técnico, o qual pode funcionar bem como uma administração centralizada que cuide de sua manutenção. A autodeterminação individual vira somente depois da satisfação das necessidades vitais reais orientadas para uma existência libre e pacificadora, amorada-de todos; porquanto esta base livre e dignamente saciada é a condição de possibilidade para o início do aprendizado sobre a construção de uma existência comum, compartilhada sob um princípio de realidade libertador. (Marinho, 2022. p.100, grifos da autora)  

Essa discussão vai ao encontro dos pressupostos CTSA no qual discute a importância do Meio Ambiente e de suas sustentáveis de utilização para superar a visão capitalista de exploração e destruição ambiental de forma ilimitada e constante, pois, esse modelo de sociedade o lucro está acima da vida e o capitalista por meio do neoliberalismo econômico avança de forma impetuosa sobre o Meio Ambiente para garantir a acúmulo de capital. Com isso, as pessoas que emergem após o rompimento da sociedade unidimensional são sujeitos históricos com o potencial de construir uma nova realidade utilizando para isso da Ciência e da Tecnologia que seriam utilizadas para a satisfazer as reais necessidades que são fundamentais das pessoas por meio de invenções e de conquistas científicos e tecnológicas contribuindo para a harmonia com a natureza (Marino, 2022).  

Sendo assim, esses sujeitos históricos poderiam transcender para uma nova realidade que irão ser capazes de tecerem decisões realmente democráticas para que a Ciência e a Tecnologia não sejam utilizadas como instrumentos de dominação e de perpetuação das desigualdades sociais. Essa nova abordagem permite que a perspectiva CTSA tenha além do caráter emancipador o poder transformador da realidade no sentido de as pessoas entenderem que a Ciência e a Tecnologia são importantes para o desenvolvimento social (Rosa, 2019).

Além disso, temos a possibilidade de tecer uma Educação CTSA/emancipador da sociedade unidimensional; pois a crítica de Marcuse a Ciência e a Tecnologia estão na área da Filosofia e a perspectiva CTSA é importante para discutir questões educacionais. Assim, iremos contrapor as ideias de Marcuse que seriam as pessoas de forma do sistema unicamente os agentes de transformação tais como, os outsides, as pessoas em situações de extrema pobreza, assim, propõem que a Educação na perspectiva CTSA integrado com as discussões de Marcuse sobre a crítica da dominação da sociedade unidimensional por meio da Ciência e da Tecnologia são frutíferas para elucidar novos agentes de transformação social. Pois entendermos que a emancipação na sociedade unidimensional encontra forte resistência na propagação na perpetuação das desigualdades sociais por meio do sistema educacional este voltado aos interesses do capital na maior parte das abordagens e que na formação inicial e continuada é distanciada de discussões e mais do potencial libertador de abordagens epistemológicas contribuindo não apenas com visões distorcidas da Ciência e da Tecnologia sendo que esta é abordada como mera consequência da primeira (Ricardo, 2020).

Diante disso, o currículo e as práticas docentes só irão ter o potencial emancipador da realidade ao propor novas maneiras de pensar outra realidade utilizando a Ciência e a Tecnologia para que de fato sejam transformadas e contribuam para um mundo com justiça social real e que não seja um mundo no qual as pessoas tenham que passar necessidades para que um pequeno grupo controle toda a sociedade ditando o que é necessidade para as demais pessoas.

 Entendermos que a perspectiva CTSA é um mote importante para construir um novo sujeito história e que a Educação nesse sentido, é eixo central pois é por meio dela que podermos formar pessoas não no sentido técnico/utilitário, mas sim que pense outras realidades para superar a sociedade unidimensional. Essa superação deve ocorrer por meio da democratização verdade da tomada de decisões não apenas bem informada, mas que desvele o caráter dominador do sistema capitalista e que tece novas possibilidades para então recuperarmos o equilíbrio ambiental do nosso planeta.

Com isso, mas do que uma perspectiva/movimento o CTSA é resinificado para que

... as necessidades emancipatórias como já existentes, apesar de reprimidas de modo eficaz, são as necessidades da vida, da ruptura com o funcionamento padronizado e planificado, em que liberdade é afirmar e reproduzir a lógica alienada da eficiência e da competição. Assim:

  1. “Reduzir drasticamente o trabalho socialmente necessário e substituí-lo por trabalho criativo”
  2. “tempo livre e autônomo em vez de lazer dirigido”
  3. “pôr fim à representação de papéis”
  4. “receptividade, tranquilidade e muita alegria, em vez do barulho constante da produção”, são o tipo de necessidades prioritárias que levariam os indivíduos e a sociedade à busca de formas de realização e satisfação que transformariam a conformação atual de brutalidade e opressão produtivista, sendo, portanto incompatíveis com “as sociedades capitalista de Estado e socialista de Estado existentes”, pois estes sistemas sociais são “reproduzidos através do trabalho alienado em tempo integral e dos desempenhos auto impulsionados”, sendo diretamente opostos à compreensão de que, dadas as condições materiais do mundo contemporâneo... (Marino, 2022, p. 122-123).  

Nesse sentido, a integração das ideias de Marcuse com a perspectiva CTSA permite que tenhamos a possibilidade de pensar o aumento da qualidade de vida das pessoas e que as pessoas entendam que a Ciência e a Tecnologia são utilizadas pelas classes dominantes para perpetuar as estruturas vigentes de poder. Assim, podermos ter na Educação um verdadeiro mote para a transformação social; pois iremos além de meros consumidores de Ciência e de Tecnologia e transcenderíamos para entendermos que elas são produtos de construção históricos-sociais utilizados pelo sistema capitalista visando a maximização do capital.

Com isso, concordarmos com Santos e Mortimer (2000)

... Não se trata de simplesmente preparar o cidadão para saber lidar com essa ou aquela ferramenta tecnológica ou desenvolver no aluno representação que o instrumentalize a absorver as novas tecnologias. Tais conhecimentos são importantes, mas uma educação que se limite ao uso de novas tecnologias e à compreensão de seu funcionamento é alienante, pois contribui para manter o processo de dominação do homem pelas ideias de lucro a qualquer preço, não contribuindo para a busca de um desenvolvimento sustentável. (Santos e Mortimer, 2000, p. 118)

Nas discussões apontadas por Santos e Mortimer (2000), percebermos que a Educação tem o papel decisivo na construção de uma sociedade mais justa e igualitária, assim, ela é importante para a emancipação humana nos moldes marcuseana visando a construção da sociedade que seja fruto de uma nova realidade. Diante disso, apontarmos que a integração é uma importante estratégia de ideias para fomentar a construção de uma racionalidade histórica que seja libertadora em contraposto a égide da sociedade unidimensional que utiliza da Ciência e da Tecnologia para controlar as pessoas e minar o pensamento libertador utilização da Educação para isso.

Sendo assim, temos que a ideia de Marcuse integrados com a perspectiva CTSA catalisa na Educação ao propor pensamentos de formas de modificar a sociedade vigente para uma nova sociedade em respeito ao Meio Ambiente como importante para sobrevivência planetária. Pois não temos como manter a sociedade unidimensional que preza pela degradação ambiental sem limites para a obtenção de cada vez mais lucros ao enfraquecer políticas ambientais e aliar o consumismo com a Tecnologia visando o mero uso descartável dos produtos para favorecer o obsoletismo programado.

Somando-se a isso, a perspectiva CTSA é um prisma importante que traz em suas entrelinhas de discussões contribuições da História, Antropologia, Economia, Ecologia, para constituir uma Educação Política para a emancipação no qual a transformação social almejada por essa perspectiva é potencializada para somente não olhar as questões envolvendo a Ciência, Tecnologia, Sociedade e Meio Ambiente mas sim que busquem soluções solucionando o problema da dominação capitalista do sistema vigente (Strieder, 2012).

Além disso, a perspectiva CTSA possibilita a emersão das práticas educativas propiciando o respeito das pessoas pois não parte da imposição de ações e sim da construção coletiva de possibilidades para a transformação social e que integradas com as ideias de Marcuse leva a elucidação de uma verdadeira liberdade, igualdade, solidariedade, democracia, justiça social, responsabilidade e também a sustentabilidade (Marino, 2022). E, além disso, temos que a perspectiva CTSA incentiva a participação individual e coletiva e que do diálogo e da Educação com estratégia para emancipação posarmos realmente construir uma nova realidade.

Com a integração das ideias partirmos para que não apenas ficarmos limitados a reflexões  mas que a construção das ideias entendam que a Ciência, Tecnologia, Sociedade e Meio Ambiente constituem um todo interligados e que a Ciência e a Tecnologia são também meios para que propormos novas realidades para tecermos alternativas ao capitalismo que certamente não é o sistema social que propicia a emancipação humana.

Diante disso, a articulação do CTSA com as ideias de Marcuse permite que tenham possibilidades de enfrentar a atual crise da democracia no qual temos o enfraquecimento da crítica por meio da criação de narrativas hegemônicas que fabricam uma realidade condicionante com a sociedade unidimensional. Os pressupostos para fortalecer a sociedade unidimensional são desveladas com a articulação do CTSA com as ideias do Marcuse para construir uma sociedade real pautada na participação cidadã das pessoas nos processos decisórios e que o véu do controle social que manipula as manifestações para de forma direta ou indireta continuar mantendo o status vigente, pois as pessoas estão em um nível de manipulação tão grande que elas não percebem as reais necessidades e  muito menos pensam em reais possibilidades de suplantação do sistema capitalista.

A participação das pessoas cientes das suas reais necessidades é um fator decisivo para a transformação da sociedade unidimensional em uma sociedade mais justa e igualitária no qual as pessoas estarão envolvidas e entenderam como ocorre os processos de tomadas de decisões de forma a transcender a própria visão de participação das pessoas como preza a perspectiva CTSA para que elas além de participar sejam protagonista do processo político no sentido de construírem uma nova sociedade em que as lutas de classes não existam mais. Assim, quaisquer tentativas que não propõem uma nova alternativa de sociedade estarão fadadas a não corresponder de fato as transformações que emancipem os seres humanos.

Nesse sentido, acreditarmos que as ideias de Rosa (2019) são importantes e complementares com a nossa proposta, pois para a concretização da democracia temos que compreender a dimensão histórico-cultural, dos mecanismos que contribuem para as decisões, assim como, os aspectos sociais que irão contribuir para desvelar os obstáculos, as dificuldades da sociedade democrática.

E acrescentarmos que a sociedade democrática é a sociedade unidimensional que foi condiciona pelos fatores econômicos e políticos de dominação para serem alienados de qualquer tentativa de construção de outra sociedade. Além disso, concordamos sobre a importância dos cidadãos na construção de uma nova sociedade no qual além de emitirem pareceres fundamentados para influenciar as decisões políticas eles transcendam para realmente conseguirem satisfazerem as suas necessidades em equilíbrio ambiental. 

Portanto, o cerne da aproximação é desvelar o caráter ilusório da sociedade unidimensional no qual ela levou (Marcuse, 1969):

...a luta pela solução ultrapassou as formas tradicionais. As tendências políticas totalitárias da sociedade unidimensional tornam ineficaz o processo tradicional de protesto- torna-o talvez até mesmo perigoso porque preservam a ilusão de soberania popular. Essa ilusão contém alguma verdade: “o povo”, anteriormente o fermento da transformação social “mudou” para se tornar o fermento da coesão social. Aí, e não na redistribuição da riqueza e igualação das classes, está a nova estratificação característica da sociedade industrial desenvolvida. Contudo, por baixo da base conservadora popular está o substrato dos párias e estranhos dos explorados e perseguidos de outras raças e de outras cores, os desempregados e os não empregáveis. Eles existem fora do processo democrático; sua existência é a mais imediata e a mais real necessidade de por fim às condições e instituições intoleráveis. Assim, sua oposição é revolucionária ainda que sua consciência não o seja. Sua oposição atinge o sistema de fora para dentro, não sendo, portanto, desviado pelo sistema, é uma força elementar que viola as regras do jogo e, ao fazê-lo, revela-o como um jogo trapaceado. Quando eles se reúnem e saem às ruas, sem armas, sem proteção, para reivindicar os mais primitivos diretos civis, sabem que enfrentam cães, pedras e bombas, cadeia, campos de concentração e até a morte. Sua força está por trás de toda manifestação política para as vítimas da lei e da ordem. O fato de eles começarem a recusar a jogar o jogo pode ser o fato que marca o começo do fim de um período. (Marcuse, 1969, p. 234-235)

Dessa forma, a luta pela transformação social é importante para que o mundo seja um lugar de convívio em harmonia das pessoas com o seu meio em consonância com o crescimento econômico sem deteriorar o meio ambiente construindo uma possibilidade de sobrevivência da espécie humana e que todas as pessoas tenham as suas verdadeiras necessidades contempladas.

Reflexões para o Ensino de Ciências na sociedade unidimensional

O contexto educacional brasileiro é majoritariamente pautado por práticas pedagógicas pautadas na repetição de exercícios visando o treino para avaliações internas e externas e de ingresso no Ensino Superior utilizando para isso de abordagens tradicionais entendidas como aquelas que os estudantes são reprodutores do conhecimento expressos em equações matemáticas que se repetidas exaustivas vezes levaram ao êxido dos estudantes (Leão, 1999; Moreira, 2017; 2021; Silva, 2019). Tal visão leva os estudantes a acreditarem na Ciência com um mero conjunto de fatos, datas e que ela é comprovada unicamente por meio de equações. Isso contribui para o desinteresse dos estudantes para a Ciência e por vêm ela como um instrumento neutro dissociado do seu contexto de produção e por entenderem a Tecnologia como apenas uma aplicação da Ciência para o mercado econômico (Silva e Errobidart, 2020; Silva e Errobidart, 2022).  

Dessa forma, o contexto educacional está contribuindo para a perpetuação da dominação do sistema vigente aumento as desigualdades econômicas e formando cidadãos passivos perante as transformações na sociedade unidimensional. E as pessoas ao estarem tão imersas elas fazem parte da sociedade unidimensional e lutam para defender o status dominante e mesmo as reivindicações não são transformadoras da realidade, com isso, é importante para a área de Ensino de Ciências tecerem reflexões e propostas que possibilitem a real emancipação das pessoas da sociedade unidimensional.

Com isso, se almejarmos o Ensino de Ciências que desenvolva novas possibilidades de sociedade é importante levarmos em consideração as discussões articuladas de CTSA com as ideias de Marcuse, pois elas contribuem para que os estudantes entendam que a sociedade no qual estão inseridos busca a dominação por meio da Ciência e da Tecnologia e o perpassar o Ensino de forma neutra e dogmática a classe dominante reafirma o seu poder econômico e política. Para pensar em possibilidades de superação dessa problemática o Ensino de Ciências deve buscar reflexões com outras áreas tais como a Filosofia, Sociologia e especificamente nesse trabalho buscarmos aproximar com Marcuse que refletiu sobre a dominação que as classes com alto poder econômico e político exercem, levando as pessoas a aceitarem a dominação pois a sociedade capitalista é a única possível segundo a mentalidade delas de existir que foi implantado pelas ideais dominantes.

O Ensino de Ciências nesse sentido avançara ao adquir um caráter de politização para que os estudantes pensem em formas de superar a sociedade unidimensional e ajudar a construir uma realidade no qual o real interesse das pessoas seja desvelado e que tenhamos chances iguais das pessoas terem uma vida plena e com as suas necessidades reais sanadas. Somando-se, a isso os estudantes serão cidadãos que irão lutar pelos seus direitos e terão os subsídios para se posicionarem perante as desigualdades da sociedade e contribuam para fortalecer as democracias, assim como, tenham capacidade de perceber os interesses de controle com a divulgação de Fake News, para que as classes dominantes mantenham o status vigente mesmo com a fome e miséria de milhões de pessoas (Moscovo, 2020; Bachur, 2021). 

Diante disso, apontarmos que a área de Ensino de Ciências avança quando discute questões que problematizam o caráter neutro que as classes dominantes querem que as pessoas tenham em relação a Ciência e a Tecnologia tais como, a discussão do negacionismo científico em uma pandemia que provocou desinformação sobre a vacinação e contribuiu para que pessoas sofram com a perda de entes queridos e que mitiguem a periculosidade do vírus causador da Covid-19. Isso permite que a articulação realizada nesse trabalho seja relevante para que o Ensino de Ciências tenha discussões com a lente dessa articulação para enfrentar a problemática atual de negação as evidências que tenham fundamentos políticos, assim, a politização é importante para desvelar os interesses da classe dominante por meio do controle que ela exerce.  

Conclusões

Neste trabalho, realizarmos a articulação entre a perspectiva CTSA com as ideias de Herbert Marcuse sobre a Ciência e a Tecnologia. Essa articulação é importante para desvelar o caráter de dominação que a sociedade unidimensional exerce por meio da neutralidade da Ciência e da Tecnologia. Essa visão de neutralidade é perpetuada no contexto educacional brasileiro de forma majoritária o que dificulta a crítica e a possibilidade de tecer novas realidades perante uma sociedade de controle intenso que manipula as pessoas para que elas defendam o sistema vigente.

Com isso, é importante que o Ensino de Ciências incorpore tais reflexões para fortalecer as discussões sobre a emancipação dos estudantes e aliado com as reflexões levantadas neste trabalho contribua para que eles possam construir uma nova realidade que seja justa e igualitária para transformar de sociedade unidimensional para sociedade para as pessoas possam desenvolver as suas capacidades e tenham as suas necessidades sanadas.  

Assim, entendermos que a perspectiva CTSA integrado com as ideias de Marcuse permite compreender questões complexas cada vez mais presentes na sociedade unidimensional tais como, o ressurgimento de movimentos de negacionismo a Ciência, como exemplo, a antivacinação e o terraplanismo, bem como, a crise das democracias com a ascensão da desinformação com intuito de controle das pessoas para que elas possam defender o sistema vigente. Com isso, apontarmos que a articulação é importante para analizar os movimentos negacionistas e a crise da democracia que são debates importantes para que a área de Ensino de Ciências avance por um lado com os debates para a superação da sociedade unidimensional e por outro com subsídios para que as pessoas entendam a dominação que as classes com poder econômico e político exercem utilização a defesa da neutralidade da Ciência e da Tecnologia.

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[1] Licenciado em Química, Mestre e Doutor em Ensino de Ciências e Professor da Escola Estadual Viriato Bandeira, Coxim/MS –Brasil. E-mail: geilsonrodrigues367@gmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2899-185X  

[2] Licenciado em Filosofia, Mestre e Doutor em Educação e Professor da Universidade Estadual Paulista (UNESP), Bauru/SP –Brasil. E-mail: carbone@faac.unesp.br ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0848-4487